Um recente estudo feito por pesquisadores da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios – APTA e da Embrapa Meio Ambiente, parte do projeto “Melhorando o manejo da pastagem como ‘solução baseada na natureza’ para sequestro de carbono no solo”, financiado pela Shell e Fapesp, contribuiu para entender como a mudança do uso da terra impacta os estoques de carbono (C) do solo no Brasil e sua relação com as mudanças climáticas globais. A pesquisa analisou a conversão de floresta (Mata Atlântica) em pastagens não manejadas e, posteriormente, a conversão dessas áreas em lavouras de soja ou em sistemas integrados de lavoura, pecuária e floresta (iLPF).
Conduzido no Instituto de Zootecnia (IZ), em Nova Odessa, SP, o trabalho revelou que as conversões de floresta para pastagem e de pastagem para usos agrícola ou sistema de integração influenciam o estoque de C no solo. Utilizando imagens do Google Earth e análises laboratoriais, pesquisadores observaram impactos ao longo de 39 anos, evidenciando a interferência de efeitos de borda nos fragmentos de floresta e a contribuição dos sistemas conservacionistas para o sequestro de carbono.
De acordo com Rafaela Ferraz Molina, em sua dissertação, a conversão de floresta para pastagem aumentou o carbono orgânico apenas na superfície do solo, sem mudança abaixo dessa faixa. Cabe mencionar que os fragmentos de Mata Atlântica avaliados na pesquisa tem forte influência antrópica, estando próximos das cidades e sujeitos e eventos de fogo ao longo dos anos, situação comum no Estado de São Paulo.
“Já a mudança de uso da terra de pastagem para o sistema iLPF elevou os estoques de C ao longo do perfil do solo até 1 m de profundidade, indicando boa contribuição para o sequestro de C e colocando o sistema integrado com alternativa no combate ao desafio climático. O iLPF demonstrou taxa média de acúmulo de carbono no solo 5 ton por ha ano. Em contraste, o cultivo de soja em plantio direto manteve o estoque de C do solo sob pastagem, sem ganhos ou perdas”, explica Molina.
O estudo destaca que sistemas conservacionistas, como o iLPF e o plantio direto, são alternativas sustentáveis para a agricultura brasileira. O iLPF favorece o acúmulo do carbono no solo, o que significa retirar CO2 da atmosfera. Atualmente, o Brasil tem 33,5% de seu território ocupado pela agropecuária, setor que contribuiu com 23,8% do PIB nacional em 2023 e 49% das exportações do país.
Especialistas alertam que a mudança do uso da terra foi responsável por 41,4% das emissões totais do setor agropecuário no Brasil. Desde 1750, a concentração de CO₂ na atmosfera aumentou, mas parte desse carbono pode ser capturada pelo solo e pelos oceanos. Estratégias que incentivem a adoção de sistemas sustentáveis são fundamentais para mitigar os impactos ambientais da agropecuária e garantir a produção agrícola a longo prazo.
A dinâmica dos estoques de carbono do solo está diretamente ligada a fatores como clima, tipo de solo e mudança no uso da terra. No Brasil, a conversão de vegetação nativa para pastagem tem sido uma das mudanças mais impactantes. De acordo com o MapBiomas, entre 1985 e 2023, 84,1% das novas áreas de pastagem foram abertas em locais antes cobertos por vegetação nativa.
Estudos indicam que pastagens manejadas corretamente podem aumentar os estoques de carbono no solo, enquanto pastos degradados tendem a perder esse recurso. A adoção de sistemas integrados, como a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, tem demonstrado potencial para reverter esse cenário, promovendo a retenção de carbono e a conservação do solo.
Para Sandra Furlan, pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente e coorientadora do estudo, o Sistema de Plantio Direto em grãos também se mostra uma alternativa eficaz para mitigar a perda de carbono, por se tratar de uma prática que não revolve o solo e permite manter ou acumular o C estocado. Entre 2006 e 2017, áreas sob este sistema cresceram 84,9%, atingindo 33 milhões de hectares em 2018.
Para incentivar práticas sustentáveis, o Plano ABC+ (2021-2030) visa ampliar o uso de tecnologias agrícolas de baixa emissão de carbono, como a recuperação de pastagens degradadas e a adoção de sistemas agroflorestais. O avanço dessas iniciativas pode garantir um equilíbrio entre a produção agropecuária e a conservação ambiental no Brasil.
Os resultados reforçam o papel das pastagens no armazenamento de carbono no solo, a questão de fragmentos de mata altamente impactados pela ação do homem, e destacam o potencial de sistemas conservacionistas e bem manejados na captura de carbono pelas plantas e estabilização de parte desse C no solo. O estudo indica que sistemas integrados, como o iLPF, podem aumentar a resiliência da agropecuária frente às mudanças climáticas, ao mesmo tempo em que contribuem para a sustentabilidade da produção agrícola e pecuária.
Fonte: Rafaela Ferraz Molina, orientador Waldssimiler Teixeira de Mattos, Co-orientadora Sandra Furlan Nogueira.