O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o "tarifaço" imposto pelo presidente norte-americano, Donald Trump, não deve afetar a relação comercial entre o Brasil e os Estados Unidos. Em entrevista à jornalista Juliana Rosa, da BandNews TV, o economista destacou que os Estados Unidos não teriam vantagem em retaliar o Brasil, já que importamos mais produtos americanos do que exportamos para eles.
"O Trump iniciou um ciclo que ainda não terminou — praticamente todos os dias surgem novidades, e o cenário ainda não se estabilizou. Ficou claro que a China é o alvo prioritário do Trump. O restante do mundo também foi impactado, com tarifas sendo aplicadas, mas penso que o conflito entre China e EUA é o tema central, principalmente porque o governo americano não resistiu à pressão dos empresários. O que foi anunciado inicialmente representou um choque muito severo; não me lembro de algo tão radical ter sido feito antes", começa o ministro.
Segundo ele, o país governado por Lula mantém boas relações com o mundo inteiro e deve estreitar ainda mais a comunicação com a União Europeia diante do "tarifaço".
"O Brasil ocupa uma posição privilegiada, pois aumentou suas exportações para os três grandes blocos econômicos: Estados Unidos, União Europeia e China. Temos acordos bilaterais muito relevantes com a China, além de acordos com o Sudeste Asiático. Também firmamos um acordo de livre comércio com a União Europeia que, na minha opinião, será acelerado em função dos últimos acontecimentos. Já em relação aos Estados Unidos, eles são superavitários frente ao Brasil — ou seja, não faz muito sentido para os EUA retaliar o Brasil, pois vendem mais do que compram de nós. O presidente Lula tomou a decisão mais sóbria possível", avalia.
"O Brasil tem um saldo comercial que varia entre 75 e 95 bilhões de dólares. Conta com mais de 300 bilhões em reservas cambiais e mantém relações comerciais com o mundo inteiro. Ou seja, estamos em uma posição confortável, com boas relações internacionais que pretendemos manter e aprofundar. Estamos em uma situação estável, na qual não devemos nada a ninguém", reforça.
Questionado, o ministro não teme uma recessão relacionada o Produto Interno Bruto (PIB) do país. “Não acredito que o Brasil tenha uma desaceleração neste nível. A economia brasileira segue saudável e com vários graus de liberdade. Temos um colchão de proteção para nos defender de turbulências externas”.
E o dólar, ministro?
Diante das últimas imposições tarifárias de Trump, o dólar foi oscilando bastante nos últimos dias. A moeda chegou a passar dos R$ 6, mas voltou a casa dos R$ 5,88, conforme cotação da última quinta-feira (10).
Haddad não deu nenhuma previsão exata, mas se manteve otimista em relação à desvalorização da moeda americana.
“Pela lógica, se os Estados Unidos têm um déficit externo de um trilhão de dólares, o natural seria que o dólar se desvalorizasse para corrigir essa distorção — e não o contrário. A valorização da moeda vai na direção oposta ao que os próprios americanos afirmam querer, que é melhorar as relações comerciais com o mundo. A desvalorização do dólar deveria ocorrer de forma mais gradual, mas isso depende da coerência da política adotada. Essa contradição precisa ser resolvida. O governo americano precisa adotar um discurso claro e coerente para que possamos entender como agir em relação ao dólar, pois, em condições normais, seria esperado que a moeda perdesse valor”, explica.
Inflação e linha de crédito
O ministro reconheceu que a inflação está alta, mas acredita que o estímulo que o governo fez ao saque do FGTS e ao crédito consignado ajudam a desenforcar as famílias que estão endividadas.
“De maneira nenhuma o estímulo ao saque do FGTS e ao crédito consignado vai atrapalhar o combate à inflação conduzido pelo Banco Central. No ano passado, tomamos diversas medidas fiscais, e o Banco Central adotou medidas monetárias justamente para conter a inflação, já prevendo um possível repique. Com a supersafra que estamos colhendo, acredito que vamos conseguir um pouso suave da economia, e a inflação deve retornar a patamares mais adequados", analisa.
“Há medidas que não podem esperar. Por exemplo, há famílias que estão pagando juros de 5% ou 6% ao mês em empréstimos. É compreensível que muitos se indignem com uma taxa de 5% ao ano, mas há pessoas pagando isso por mês. Se não oferecermos uma alternativa para essas famílias agora, com os juros em alta, elas se tornarão superendividadas em poucos meses. Por isso, precisamos agir preventivamente”, acrescenta.